Em uma análise própria, de uma pesquisa da CB Insights com os 20 principais motivos para fracasso de Startups, realizada em 2018, entendi que muitas histórias de empresas poderiam ter sido diferentes com a atuação forte de profissionais de Marketing, ajudando na estratégia e execução da mesma.
Infelizmente não foi e nem é isso que acontece, por uma série de fatores. Posso citar questões como a escassez de profissionais ou parceiros experientes, mas também a questão de que como Startups possuem a base em tecnologia, algumas coisas são deixadas de lado, não se tornam prioridade. Pela minha percepção, isso pode acontecer, inclusive com o Marketing.
Fiz a análise dos 20 principais motivos expostos pela pesquisa e como é possível contornar isso. Confira a análise abaixo!
A pesquisa da CB Insights
A pesquisa completa pode ser acessada aqui. Ela faz a análise de 101 Startups que já fecharam e seus motivos, que podem ser complementares (não são exclusivos). Portanto, podia-se marcar vários motivos.
Marquei todos os motivos em que o Marketing está (ou deveria estar envolvido) em negrito, com seus motivos e seus percentuais de seleção pelos participantes. Irei explanar cada ponto abaixo, depois da lista.
- Sem demanda de mercado – 42%
- Acabou o dinheiro – 29%
- Não era o time certo – 23%
- Foi superado pela concorrência – 19%
- Precificação ou problema de custos – 18%
- Produto pouco amigável ao usuário, experiência ruim – 17%
- Produto sem um Modelo de Negócios – 17%
- Marketing ruim – 14%
- Ignorou os consumidores – 14%
- Produto perdeu o timing – 13%
- Perda de foco – 13%
- Falta de harmonia entre time / investidores – 13%
- Precisou pivotar e deu errado – 10%
- Falta de paixão – 9%
- Falha em expandir geograficamente – 9%
- Sem investimento / interesse de investidor – 8%
- Problemas legais – 8%
- Não usou a rede de contatos – 8%
- Burn out – 8%
- Precisava pivotar e não pivotou – 7%
Onde e como o Marketing poderia atuar para reduzir a mortalidade
Se formos considerar apenas o Top 10 motivos selecionados, teremos 8 em 10 onde o Marketing poderia atuar para mitigar os riscos de insucesso. Veja os motivos e como contornar isso em cada tópico.
1. Sem demanda de mercado – 42%
O lançamento de um produto digital sem que haja a demanda por parte dos consumidores soa como algo muito arriscado e amador. Na verdade, pode fazer sentido lançar algo “sem a demanda”, baseando-se em pesquisas com pouco aprofundamento ou em premissas estratégicas como do Oceano Azul, achando que pelo fato de ninguém estar operando naquele espaço, daquela forma, existe um oceano azul a ser explorado, o que pode ser verdade ou mentira.
Pensar e agir dessa forma, como a estatística mostra, pode não ser muito assertivo. Para reduzir esse risco é importante ter um profissional de Marketing apoiando a decisão estratégica, estudando o mercado de forma condizente com a proposta e assim ajudar a nortear os próximos passos, sejam eles de desenvolver o produto ou abandoná-lo.
A experiência aqui é muito importante, mesmo que não da equipe fundadora. Aceleradoras, incubadoras e consultores podem ser de excelente uso para traçar essa visão do mercado tão necessária para mitigar as chances de fracasso.
Não é uma questão de inibir a inovação e achar que sem esses movimentos arriscados empresas como Uber ou Airbnb não existiriam. Na verdade, essas empresas tiveram uma incrível demanda de mercado quando lançaram, talvez não imediatamente no lançamento, mas ao longo do tempo. O Airbnb talvez não como os fundadores esperavam, mas foi possível adaptar a ideia para o que o mercado realmente queria.
4. Foi superado pela concorrência – 19%
Perguntas que um profissional de Marketing precisa saber responder:
- Quais são seus principais concorrentes?
- Como eles se posicionam?
- Como conseguem novos clientes?
- Como precificam?
- Qual a base estimada de clientes deles?
Essas perguntas ajudam a entender o quão bem o mercado está indo e em que sua empresa está acertando ou errando. Quando se inicia em um mercado onde já existem players consolidados, pode ser mais fácil conseguir essas informações por meio de reportagens, ferramentas de Marketing e clientes ocultos.
Quando existe uma leva de muitos concorrentes que nasceram em um espaço curto de tempo, acompanhar tudo isso pode ser mais trabalhoso, mas não é desculpa para não saber e acompanhar o mínimo. Boas ideias podem e devem ser copiadas, na medida do possível.
Existem alguns conceitos de Inteligência Competitiva (IC), que são muito valiosos quando aplicados ao Marketing Empresarial, como os KITs e KIQs. Esses conceitos simplificam o entendimento e aplicação de práticas de IC, possibilitando a delegação dessas atividades para pessoas à margem da empresa, descentralizando a coleta de informação.
5. Precificação ou problema de custos – 18%
A precificação é um grande desafio para Startups que estão começando. Afinal, como saber quanto um cliente está disposto a pagar por um produto ou serviço, sem deixar dinheiro na mesa? Além disso, como precificar de forma a conseguir suportar o longo caminho para o break-even?
A forma como o valor é cobrado também é importante. Seu cliente terá acesso ilimitado aos recursos por um valor X por mês ou ele pagará na medida que for usando? O que soa mais transparente para o mercado em que você está? E o que “forçará” os clientes usarem seu produto, já que estão pagando por ele?
A verdade é que cobrar por uso pode lhe gerar problemas, já que você pode possuir um custo fixo alto e os clientes só pagarão pela quantidade que usarem. Talvez cobrar um valor fixo mensal e mais alto permita que você tenha sua margem garantida, exceto em caso de usuários com alto uso da solução, o que aumentaria os custos de hardware ou suporte.
Se você tiver um plano que permite que eles usem seu produto com mais flexibilidade, como no valor fixo mensal, você também poderá “forçar” o uso do produto, deixando os clientes mais engajados e garantindo que seu produto seja importante no dia a dia da empresa do cliente.
Eu falei sobre posicionamento de Marketing e precificação neste conteúdo: Razões para alinhar Tecnologia e Marketing em Produtos Digitais
6. Produto pouco amigável ao usuário, experiência ruim – 17%
Considerando todos os produtos de software que existem hoje no mercado e padrões de usabilidade já estabelecidos, como é possível que uma empresa falhe grandemente desenvolvendo uma solução que seja de péssima utilização? A resposta certamente está relacionada a pouca pesquisa e benchmark não feito ou mal feito.
Ao começar a concepção de um produto, é importantíssimo que já se tenha as referências visuais, não apenas de business para inspirar seu produto. Se inspirando em exemplos que deram certo, você não vai precisar reinventar a roda e seus usuários se sentirão mais confortáveis ao utilizar sua experiência desde o primeiro momento.
Imagine o usuário tendo que entender sua proposta e ainda ter que entender como navegar em sua solução. Parece um pesadelo e isso infelizmente acontece com mais frequência do que deveria. O ideal é deixar a experimentação para features futuras ou quando realmente fizer todo sentido, em seu contexto, fazer algo completamente diferente do que o mercado está acostumado.
7. Produto sem um Modelo de Negócios – 17%
Como uma empresa vai ganhar dinheiro? Qual será a forma de captação de novos clientes? Qual o posicionamento da empresa caso um grande cliente queira exclusividade com o produto (e com isso ditar o futuro da empresa)?
Essas são questões que podem parecer sensatas de serem pensadas e discutidas apenas quando acontecem ou quando a empresa avança, mas isso não poderia ser menos verdade. E infelizmente, é bem comum deparar com pessoas que querem empreender e que não sabem como irão rentabilizar em cima do que oferecem.
A verdade é que isso não é algo que se descobre no meio do caminho. É claro que é possível fazer alterações no Modelo de Negócios da empresa ao longo do tempo, a fim de evoluí-lo. Porém, iniciar um empreendimento digital fazendo suposições e contas de padaria de como seria possível ganhar dinheiro não é algo sensato.
Para se aprofundar nesse assunto, recomendo os nossos artigos:
- Plano de Negócios: Passo a passo de como fazer o seu do zero
- Canvas: Passo a passo para estruturar seu negócio
8. Marketing ruim – 14%
Produto bom se vende sozinho? Com certeza não. E como dizia o velho ditado: “o que não é visto, não é lembrado.”
Tudo bem que sua empresa pode optar por um Marketing mais direcionado, abordando os clientes em potencial ao invés de trabalhar um Marketing mais aberto, como Inbound Marketing. De qualquer forma, isso precisa estar claro internamente, para a equipe de Vendas e Marketing.
Não entender a melhor forma de abordar seu mercado irá fazer sua empresa mudar de rumo diversas vezes, de forma a minar os ânimos internos e gastando dinheiro de forma não eficiente. Portanto, entenda como será o posicionamento de seu produto e vá atrás dos clientes, seja por anúncios, ligações, emails ou conteúdos focados em SEO.
9. Ignorou os consumidores – 14%
Como é possível conduzir uma empresa sem coletar feedback dos usuários? Certamente é a fórmula para o insucesso. Especialmente quando suas maiores contas ou a maior parte dos seus clientes dizem a mesma coisa sobre seu produto/serviço.
Esses feedbacks são insumos importantíssimos para o direcionamento estratégico e de produto da sua empresa. Muitas empresas pagam por pesquisas de mercado, mas acabam ignorando opiniões que são dadas de graça por seus usuários… isso não faz sentido algum.
Além disso, é importante, quando possível, envolver nas primeiras etapas do desenvolvimento, os usuários que sua empresa já tem como perfil ideal, para que eles possam participar e ajudar a maturar a proposta antes que ela vá para o mercado.
Um MVP pode levar de 3 a 12 meses para ficar pronto, dependendo da sua complexidade, alguns até mais. Mas é importante não passar mais do que 3 meses sem envolver possíveis usuários para validar as premissas do produto.
10. Produto perdeu o timing – 13%
Muito provavelmente essa será uma questão que envolverá diversos setores (ou profissionais) e será difícil realmente apontar um culpado (isso, de fato, não é necessário).
A questão aqui envolve a decisão de lançar um produto inacabado, que pode arruinar todo o negócio e “queimar o filme” da sua empresa com os usuários, afastando eles definitivamente da sua marca. Provavelmente um erro irreparável para uma pequena empresa.
Outro lado é lançar um produto muito bem acabado e correr o risco de perder o timing de lançamento, para outros concorrentes que lançaram coisas semelhantes, sem que você tenha uma grande diferencial quando lançar.
Nessa questão a experiência de profissionais experientes pode ser um grande diferencial, medindo os prós e contras de atrasar e adiantar o lançamento. Para mais detalhes, leia 7 razões para Postergar o Lançamento de um Produto.
15. Falha em expandir geograficamente – 9%
Em geral a decisão de expandir geograficamente parte do C-Level, mas quem vai conduzir a operação taticamente e tecnicamente será principalmente a equipe de Marketing.
Isso é verdade porque expandir significa conversar com diferentes públicos, entender essa dinâmica cultural de cada região, os principais players e competidores, além de ter de trabalhar com anúncios, SEO e línguas diferentes.
Tudo isso envolve um trabalho técnico muito pesado e muitas vezes menosprezado pela maioria das empresas. O ideal aqui talvez seja buscar um consultor de Marketing que tenha experiência em internacionalização para ajudar a conduzir todo o processo e garantir que ele aconteça corretamente.
Quando falo em internacionalização, penso muito no Slack e o tempo que demoraram para adicionar novas línguas à plataforma deles. Isso porque expandir geograficamente é de fato um desafio e manter um alto nível de excelência em várias línguas requer profissionais pró-eficientes tanto operacionalmente quanto no nível de gestão.
Lembre-se: uma expansão geográfica não é apenas linguística, mas também de cultura, novos players e planejamento. O que era feito para apenas um cenário, será multiplicado pela quantidade de países e línguas que for atuar.
16. Sem investimento / interesse de investidor – 8%
A questão do investimento pode na verdade revelar muitos outros problemas, alguns já citados acima. Um dos ainda não citados é justamente depender de investimento para conseguir chegar no break-even.
Uma percepção pessoal minha, baseada em pesquisas e matérias que tenho lido e que surgem com maior frequência, é de que investidores estão cada vez menos propensos a investir em startups que ainda não conseguem pagar as contas ou que não possuem isso bem próximo de acontecer.
Operar no vermelho por muito tempo pode trazer vícios de gestão e pode, às vezes, representar uma mentalidade errada sobre um negócio. Apenas buscar faturamento, sem rentabilizar, pode indicar uma visão errado dos empreendedores sobre como conduzir o crescimento.
Outra questão que chama atenção em não conseguir investimento é o fato da startup não gerar apelo suficiente para receber aporte. Isso pode se dar por ela não estar bem posicionada no mercado, não ter gerado o buzz necessário, por não ter atingido o Product Market Fit, entre outras possíveis questões.
Uma solução para este tópico é realmente trabalhar num cenário menos otimista, considerando a não aquisição de um investidor até atingir o break-even, para evitar medidas dramáticas.
20. Precisava pivotar e não pivotou – 7%
A decisão de pivotar pode ser óbvia para alguns negócios, porém a fé de que tudo vai se resolver com um pouco mais de tempo acaba levando ao fim do empreendimento.
Neste caso, o profissional de marketing deverá antecipar tendências, promover estudos, análises e realmente deixar um pouco mais claro para quem está tomando a decisão (obviamente nunca é fácil tomar decisões) que é preciso mudar de rumo.
Como eu já disse, esse radar analisando o mercado o tempo todo é de suma importância para qualquer empreendimento, porque as coisas podem mudar rápido demais, especialmente quando se mistura inovação e tecnologia.
Conclusão
O caminho para o sucesso de uma startup começa na boa identificação de uma ideia, em uma execução tecnológica de qualidade, além de uma gestão satisfatório somada a um acompanhamento e estudo de cenário constante.
Ao propor novas soluções para antigos problemas, os fundadores e gestores não podem se esquecer dos “antigos” métodos de gestão, auxiliares no processo de sucesso de milhares de empresa mundo afora.
“Usar apenas o Canvas” ou não formalizar a estratégia é uma prática que não pode ser adotada por quem quer mitigar os riscos de um empreendimento que já é de bastante risco, por natureza.
Matéria adaptada do portal: https://www.gobacklog.com/
Para ler na íntegra acesse: https://www.gobacklog.com/blog/startups-falham-no-marketing/